A pergunta constrangedora surgiu durante uma “live” para o primeiro grupo de pessoas presentes conosco no retiro online para casais, o Aprendendo a Amar. Aquela primeira “live” tinha como tema a vida sexual e, coincidentemente, – na verdade foi um presente de Deus -, o Padre Vicente da Comunidade Bethânia estava presente conosco, e nós o convidamos para participar. O Padre Vicente havia convivido muito tempo com o nosso amado e saudoso Padre Léo; havia também assimilado conceitos bem importantes sobre a vida sexual, e era, então, um bom momento para nos valermos de sua presença. Convite feito, e ele aceitou
Padre Vicente começou a falar sobre intimidade, sobre a importância ou a falta de discernimento quanto a importância do lugar da relação sexual na vida a dois e, sem que nós esperássemos, ele nos lançou a pergunta: qual é o órgão sexual mais importante?
Estávamos ao vivo e Eliana e eu nos olhamos e, até aquele momento, não havíamos entendido muito bem até onde ele queria nos levar. Havia alguma pista, entretanto nós resolvemos não arriscar qualquer resposta que poderia “derrubar” a transmissão. Com extrema delicadeza o Padre Vicente nos explicou que o órgão sexual mais importante é o ouvido.
Eliana e eu, bem mais à vontade, imediatamente mergulhamos decididamente num tema que nos é tão importante, exatamente por se tratar de nossa vivência como casal, que é, exatamente, a descoberta desta extraordinária habilidade de escutar o outro, e escutar até o fim. Um novo conceito para nós, fruto de nossa experiência, quando afirmamos que, na base do diálogo, está a habilidade exercitada de ouvir o outro. Eis a chave da intimidade entre um homem e uma mulher.
Portanto, intimidade é a palavra mais importante, e é o que deriva de uma escuta generosa na vida a dois.
Naturalmente, é preciso rever o conceito que se tem sobre a intimidade, sob o risco de o casal reduzir a vida sexual ao momento de nudez, carícias e orgasmo.
E mais: “uma visão negativa e pecaminosa da sexualidade é um dos elementos mais destruidores do matrimônio. Por isso, não podemos mais admitir a compreensão estragada da sexualidade, especialmente quando querem vivê-la dissociada da vida matrimonial cristã. A sexualidade precisa ser compreendida não somente como um encontro ocasional ou periódico entre marido e mulher, mas precisa envolver, além do prazer físico, a dimensão psíquica e espiritual. Esse envolvimento se traduz em amizade, orgasmo, companheirismo, amor, afetividade, troca, doação”, assim explica o Padre Leo no livro Sede Fecundos da editora Canção Nova.
Preste bem atenção, pois isso nos presenteia um novo paradigma quando o assunto é sexo, intimidade e amor.
Eliana e eu, já faz muitos anos, escolhemos crescer em intimidade conversando. Não sabemos precisar muito bem, mas, por volta de 2009, por conta de grandes exigências que vivíamos, era preciso conversar, abrir o coração e buscarmos um modo de nos expressarmos sem filtros e crescer em confiança e cumplicidade. Desta forma, o diálogo se tornou o ingrediente mais importante do nosso casamento. Entretanto, nós compreendíamos que mais do que falar, aquele era um momento onde nós precisávamos escutar um ao outro. E foi aí que nós começamos a nos exercitar na escuta.
Na prática, nós nos sentávamos e nos perguntávamos sobre os valores essenciais da nossa vida e que poderiam nos sustentar naquele momento e, a partir daí, eu me dedicava a escutar a Eliana falar e falar até o fim. O objetivo daquele momento era oferecer para minha mulher uma experiência de amor a escutando falar até o fim, sem censurar, sem criticar, sem buscar interpretar, sem consertar, e sem aquela preocupação de dar uma resposta ou orientação. A intenção mais importante era conceder à Eliana uma experiência que lhe dissesse que ela poderia me dizer, ou, melhor ainda, que ela poderia dizer-se para mim. Na verdade, tratava-se de uma experiência de entrega! Eu estava, então, ali, disposto a ouvir a Eliana e, a ouvindo, lhe garantir que ela cabia dentro do meu coração.
A partir daí, nós fomos exercitando esta experiência de intimidade cada vez mais crescente. Fomos conhecendo um do outro gostos e sentimentos profundos, tristezas, mágoas, decepções e alegrias; fomos aprendendo a descrever momentos importantes da vida e aqueles aspectos fundamentais que expressam, profundamente, quem somos um para o outro.
Perceba que a palavra “entrega” é muito importante!
Experimentamos exatamente aquilo que o padre Léo diz, quando ele afirma que a vida sexual se traduz em amizade, orgasmo, companheirismo, amor, afetividade, troca, doação. Grande perigo, em vista disso, é viver a vida sexual dissociada do dia a dia, e, a grande sacada é viver em intimidade dialogal, as propostas oferecidas pelo dia a dia da vida a dois.
Quando tenho Eliana nua em meus braços, eu experimento que a possuo inteiramente, pois sou conhecedor de quem minha mulher é!
Algum segredo?
– eu a escuto!